terça-feira, 15 de abril de 2014

Do nada

Imita- sonho era o nome daquele pássaro. Sobrevoava as planícies orvalhadas da terra do ouriço cacheiro. Imita-sonho, piava e cantava ao mesmo tempo. Fazia dois sons em um só. Era como uma lâmina afiada o primeiro e o segundo um assobio frio de dar arrepios.
Havia um homem que andava distante do sol, por aquela terras esquecidas, de orvalho frio e denso, um homem que ouvia tudo, mas não enxergava nada. Imita-sonho faiscava pelos arbustos, se esfregava entre a fuligem, aninhando-se próximo aos seus herdeiros. O homem caminhava de olhar baixo procurando uma resposta e nada entendia de seus próprios pensamentos, muito menos dos bichos que vinham da terra do ouriço- cacheiro. Rezava a lenda que o próprio ouriço cacheiro, já havia saído daquelas paragens há muita carga de tempo. Havia pego sua lenha, sua bagagem de mão e seus espinhos e tomado rumo pra outras bandas, e sempre que sentia saudade de casa, cantava: minha mulher, foi, foi, foi, foi, foi... A história era a de sempre: a mulher desalentada havia deixado o marido espinhoso, indo aleitar-se em outras gramas. Ouriço muito sofrido, resolvera ir atrás do seu bem.
Mas o homem, o que ali fazia? Procurava a resposta para suas agonias. Enfim, um belo dia deu-se o Nada. Ele esvaziou e trouxe o Foi. Aí o pássaro, olhou pela primeira vez, e nada viu. Olhou e certificou-se de que nunca havia visto um homem, nem mesmo o calor de uma sombra perdida, cansada, desalentada, uma sombra suspirante. O homem nunca havia sido. Imita-sonhos criava histórias e hoje esbarrava nessa, de ver o que nunca havia visto, nem estado, nem existido...