sexta-feira, 8 de julho de 2011
terça-feira, 21 de junho de 2011
surfe
Desconsertada
Desconcentrada
Centrada em um desvio de mim mesma
Palavra que corre solta
Pensamentos que escapam
Não penso em desistir
Mas no momento parece difícil lutar
Acho melhor abrir um livro e flutuar
Quem sabe volte logo e tome o prumo
Sossego o desvario
Pode ser que demore e eu me perca no caminho de volta
Talvez perdida encontre o barco e retorne ao porto
Não posso fugir disso que me toma
Desconcentrada
Centrada em um desvio de mim mesma
Palavra que corre solta
Pensamentos que escapam
Não penso em desistir
Mas no momento parece difícil lutar
Acho melhor abrir um livro e flutuar
Quem sabe volte logo e tome o prumo
Sossego o desvario
Pode ser que demore e eu me perca no caminho de volta
Talvez perdida encontre o barco e retorne ao porto
Não posso fugir disso que me toma
quarta-feira, 1 de junho de 2011
Acordei de um susto. Levantei e a primeira coisa que fiz foi me certificar de que meu coração ainda estava batendo. O dia foi longo e cansativo o ritmo forçado tinha acelerado demais meu pobre coraçãozinho. Acordei de um susto, durante a noite e percebi que as coisas estavam diferentes. Meu peito vazio, um buraco. Era como se o aquela aceleração tivesse cessado, mas ao mesmo tempo algo doía dentro do buraco no peito. Era como se tivessem cavado um buraco no meu peito. Pensei que talvez tivesse exagerado na janta e, desarranjado de vez aquele pobre relógio que batia incessante, descompassando e compassando minha existência. Despertei triste, desacelerada, com medo. Imaginei que talvez tivesse chegado a hora de atravessar a ponte da saudade. Olhei para o lado me certificando que tudo continuava do mesmo jeito. Será que a derradeira é realmente como alguns acreditam; em um primeiro momento,da mesma forma que aqui? Será que serei avisada de que chegara o meu fim? Preferindo certamente ser avisada por uma figura angelical, por um signo de amor e de luz; nada de foice, capa preta. Resolvi levantar, esticar as pernas, beber um copo dágua e enfrentar a notícia avassaladora do vazio do meu coração.
quinta-feira, 5 de maio de 2011
tom maior
feita de uma nota a cor permaneceu muda
sombria e fosca jamais ousou entoar em outro tom
perdeu-se no emaranhado de si
ensimesmada
deu o tom
deu-se dois, três
por fim fizeram um acordo:
-acordamos juntas que a natureza morta não existe
brincamos no silêncio entre pausas e rodopios
desdobramos em mel, em dias
e assim floresce em nossos rodopios a canção
de um cinza fosco ao matiz mais quente…
em tom maior
de mim
menor
sombria e fosca jamais ousou entoar em outro tom
perdeu-se no emaranhado de si
ensimesmada
deu o tom
deu-se dois, três
por fim fizeram um acordo:
-acordamos juntas que a natureza morta não existe
brincamos no silêncio entre pausas e rodopios
desdobramos em mel, em dias
e assim floresce em nossos rodopios a canção
de um cinza fosco ao matiz mais quente…
em tom maior
de mim
menor
terça-feira, 3 de maio de 2011
de repente...
Jurema resolveu ousar. Colocou aquele vestido vermelho escondido no fundo do armário e foi circular
sozinha pela Lapa. O que haveria causado aquele impulso estilo dama da lotação?Ela não se perguntou e mal teve tempo pra ouvir seus pensamentos, eles estavam amortecidos por uma dose de destilado, tomada antes de bater a porta de casa.
Saiu faceira, rebolativa e sorridente. Parecia mesmo uma menina(nada de lotação).
Esbarrava nas pessoas e sorria, ao invés de desculpas. Atravessava as ruas cintilante, dava boa noite pro policial, pra moça triste de pé em frente da farmácia.
Subiu como uma princesa os degraus da escadaria da gafieira. Tropeçou na entrada e foi amparada por Jorge.
Jorge e Jurema dançaram a noite inteira. Ao final da última música, ela pediu licença, agradeceu a companhia e saiu correndo em direção a escadaria. Jorge não pode nem mesmo pedir seu número, seguir seus passos. Ela sumiu. Como num conto de fadas.
Jorge voltou pra casa arrastando os sapatos, pisando no rabo do gato, chutando lata amassada. Nunca havia visto uma mulher como aquela. Como sobreviver a isso sem ao menos um beijo de despedida?
Jorge chegou em casa sorrateiro, para não acordar o velho que dormia no sofá e pensou que na próxima talvez tivesse um pouco mais de sorte e, quem sabe o destino lhe fosse generoso, dando a graça de mais uma dança com aquela dama desconhecida de vestido vermelho.
Jurema voltou pra casa urgente, era preciso encerrar a noite daquele jeito mágico que havia começado. Pendurou o vestido, tomou um banho delicioso e foi pra mesa da cozinha tomar um xícara de chá antes de dormir.
Tudo parecia fácil demais, seus pensamentos continuavam ausentes, era como se devesse estar ali, naquele momento, só seu.
Deitou-se na cama e vagamente a imagem de Jorge circulava em sua cabeça. Sentia o toque suave e firme de suas mãos a guiando pelo salão. O sorriso cativante que a desconsertava nas horas em que perdia o prumo e pisava ligeiramente envergonhada em seus pés.
Aquela era um noite especial, jamais havia saído sozinha de casa, determinada e feliz. Esperava sempre o convite, o telefonema que não vinha. Dessa vez era sua a noite e quem sabe da próxima pudesse compartilhar com alguém aquela sensação maravilhosa de estar solta e desamarrada de expectativas. Fechou os olhos, esqueceu suas orações e adormeceu suave e alegre.
sozinha pela Lapa. O que haveria causado aquele impulso estilo dama da lotação?Ela não se perguntou e mal teve tempo pra ouvir seus pensamentos, eles estavam amortecidos por uma dose de destilado, tomada antes de bater a porta de casa.
Saiu faceira, rebolativa e sorridente. Parecia mesmo uma menina(nada de lotação).
Esbarrava nas pessoas e sorria, ao invés de desculpas. Atravessava as ruas cintilante, dava boa noite pro policial, pra moça triste de pé em frente da farmácia.
Subiu como uma princesa os degraus da escadaria da gafieira. Tropeçou na entrada e foi amparada por Jorge.
Jorge e Jurema dançaram a noite inteira. Ao final da última música, ela pediu licença, agradeceu a companhia e saiu correndo em direção a escadaria. Jorge não pode nem mesmo pedir seu número, seguir seus passos. Ela sumiu. Como num conto de fadas.
Jorge voltou pra casa arrastando os sapatos, pisando no rabo do gato, chutando lata amassada. Nunca havia visto uma mulher como aquela. Como sobreviver a isso sem ao menos um beijo de despedida?
Jorge chegou em casa sorrateiro, para não acordar o velho que dormia no sofá e pensou que na próxima talvez tivesse um pouco mais de sorte e, quem sabe o destino lhe fosse generoso, dando a graça de mais uma dança com aquela dama desconhecida de vestido vermelho.
Jurema voltou pra casa urgente, era preciso encerrar a noite daquele jeito mágico que havia começado. Pendurou o vestido, tomou um banho delicioso e foi pra mesa da cozinha tomar um xícara de chá antes de dormir.
Tudo parecia fácil demais, seus pensamentos continuavam ausentes, era como se devesse estar ali, naquele momento, só seu.
Deitou-se na cama e vagamente a imagem de Jorge circulava em sua cabeça. Sentia o toque suave e firme de suas mãos a guiando pelo salão. O sorriso cativante que a desconsertava nas horas em que perdia o prumo e pisava ligeiramente envergonhada em seus pés.
Aquela era um noite especial, jamais havia saído sozinha de casa, determinada e feliz. Esperava sempre o convite, o telefonema que não vinha. Dessa vez era sua a noite e quem sabe da próxima pudesse compartilhar com alguém aquela sensação maravilhosa de estar solta e desamarrada de expectativas. Fechou os olhos, esqueceu suas orações e adormeceu suave e alegre.
sexta-feira, 29 de abril de 2011
Sorrindo
Um sorriso é aceso, vivo, contexto, é caminho a ser
Os olhos perseguem um belo curso que se abre em um viçoso sorriso
Assim como se desviam de uma lacrimosa passagem
... Córrego assustador esse da tristeza...
Mas eu vim aqui pra falar do sorriso.
Já sentiram um coração pulando, espumando e jorrando quente, como se acendesse lá em baixo no dedão e ascendesse lá pra cima, no topo da cabeça?
Retrato em movimento, força exuberante e vital
Um sorriso compartilhado, motivado e sonorizado por uma estrondosa gargalhada...
Brotado pequeno, infâme e provocativo
Na penca da alma desabrocha um sol
Presença desavisada da felicidade, alegria desvairada
Fome de viver, sede de amar
Talvez o sorriso não seja nada disso
Apenas uma janela que se abre aonde a alma se enquadra sem propósito de estar apenas de ser: um belo, alegre, despretensioso sorriso...
Apenas uma janela que se abre aonde a alma se enquadra sem propósito de estar apenas de ser: um belo, alegre, despretensioso sorriso...
domingo, 24 de abril de 2011
terça-feira, 5 de abril de 2011
na cadência
Sujeito da fala
Dono da palavra
Toma para si o objeto
Torma-se o objeto
Mascarado de desejo
Recebendo e dando sentido
Absorvendo o sentido de um outro
Carregando de som o sentido de um outro
Parte que evoca o todo
Meio através de
No lugar do sentido de outro
Criação
Lugar de nada
De tudo-pode
Deslizamento
Surpresa
movimento
Ponto
Começo
Recomeço
Oração
Ponto-de-estopo
Condensa Desliza Condensa Desliza Desliza
Amo-te
Hoje acordei romântica
Contorci meu corpo
Tropecei como um zumbi
Tomei um gole forte e acordei
Sacudi a cria
Ouvi no carro uma linda do Djavan
Estou como um saveiro
Cruzando a buzina de um transatlântico
O vento bate gelado nas folhas amareladas da estação
Sua presença bonita ao meu lado
Seu olhar sério, sua voz baixa e veloz
Suas mãos macias e seus cabelos cacheados
O tempo... sem pressa por nós dois
Elo justo, fiel…
Afrouxo o laço do tempo..
domingo, 3 de abril de 2011
INVEJA
Ela exala desejo e juventude
Eu invejo cada passo, cada trilha desenhada
Eu invejo cada passo, cada trilha desenhada
Ela é livre, atlética, doce e delicada
Eu sou alguém que rema, rema e não sai do mesmo lugar
Eu sou rígida, frígida, enfurecida
Ela é deusa, ninfa, literária, efêmera
Eu odeio-a em cada palmo de pele, em cada poro de existência
Ela é amor, gratidão
Eu busco meus recursos em mim mesma
Ela nos outros, nas pessoas, nos lugares, nos amigos
Eu sou incapaz e crua
Ela é fresca, é nua
Eu sou palavra
Ela é poema
Eu sou verso
Ela é matema
Eu sou pequena
Ela é incomensurável
Sou de menos
Ela é demais
Sou do tamanho de um botão
Ela desata os nós, afrouxa os laços, solta a imensidão
Eu invejo
Ela cria
Eu padeço
Ela desafia
Eu coroa
Ela cara
Cobra rastejante
Gostaria de arracar-lhe os olhos, as vísceras
Beber-lhe o sangue, dilacerar sua voz, seu rosto, seus olhos cor do mar
Tomar pra mim o que é seu
Juntar com aquilo que é meu
Deixar-lhe sem nada
Apavorada e desaprovada
Feia, infeliz, sozinha
Sombria, deprimente, aguardente
Mulher que mata no olhar
Mulher rival
Destruída
Apagada
Morta
Dilacerada
Manchete de jornal
Pecado de mulher
É querer ser outra
A Outra mulher
Em palavras
Para calar o malgrado
Em versos
Para expurgar
O mau-olhado
quinta-feira, 31 de março de 2011
Ode a melancolia
Serve-se do meu corpo
Bebe da minha taça
Segue meus passos
(guia meus passos)
Veste-se de negro nos dias sombrios.
Desnuda-se de vento nos dias funestos.
Ascende no cigarro
Contempla o céu cinzento às horas arrastadas de um dia chuvoso.
A bela mulher perde sua forma quando quer
Ganha dimensão etérea
Desliza sobre os pensamentos
De salto alto
Dissolve-se em mais um cigarro…
Mulher
Só
Mesmo mulher
Secreta, escorregadia
Imagem real
O outro lado do espelho
Figura ilusória, descampada, desolada, sonsa, encantadora
Fenece entre as estrelas, vaga plena, sorrateira, fértil
Fantasma assustador
Suspira nos versos de um trovador perdido
Canta na melodia torta das paixões esquecidas
Vaga descoberta
Arrasta o véu coberto de estrelas…
…Através dos seus lábios…
Palavras faltosas
Pausas infindáveis
Ecos silenciosos
...Certos dias…
Perco-me em seus passos
...Através dos seus olhos…
Espelho
desalmado
Percebo
Recebo
A bela
Encantadora
Assustadora
Mulher
Bebe da minha taça
Segue meus passos
(guia meus passos)
Veste-se de negro nos dias sombrios.
Desnuda-se de vento nos dias funestos.
Ascende no cigarro
Contempla o céu cinzento às horas arrastadas de um dia chuvoso.
A bela mulher perde sua forma quando quer
Ganha dimensão etérea
Desliza sobre os pensamentos
De salto alto
Dissolve-se em mais um cigarro…
Mulher
Só
Mesmo mulher
Secreta, escorregadia
Imagem real
O outro lado do espelho
Figura ilusória, descampada, desolada, sonsa, encantadora
Fenece entre as estrelas, vaga plena, sorrateira, fértil
Fantasma assustador
Suspira nos versos de um trovador perdido
Canta na melodia torta das paixões esquecidas
Vaga descoberta
Arrasta o véu coberto de estrelas…
…Através dos seus lábios…
Palavras faltosas
Pausas infindáveis
Ecos silenciosos
...Certos dias…
Perco-me em seus passos
...Através dos seus olhos…
Espelho
desalmado
Percebo
Recebo
A bela
Encantadora
Assustadora
Mulher
quinta-feira, 24 de março de 2011
Oração ao Tempo- Caetano
És um senhor tão bonito
Quanto a cara do meu filho
Tempo tempo tempo tempo
Vou te fazer um pedido
Tempo tempo tempo tempo..Compositor de destinosTambor de todos os rítmos
Tempo tempo tempo tempo
Entro num acordo contigo
Tempo tempo tempo tempo…
Por seres tão inventivo
E pareceres contínuo
Tempo tempo tempo tempo
És um dos deuses mais lindos
Tempo tempo tempo tempo…
Que sejas ainda mais vivoNo som do meu estribilho
Tempo tempo tempo tempo
Ouve bem o que te digo
Tempo tempo tempo tempo…
Peço-te o prazer legítimo
E o movimento preciso
Tempo tempo tempo tempo
Quando o tempo for propício
Tempo tempo tempo tempo…
De modo que o meu espírito
Ganhe um brilho definido
Tempo tempo tempo tempo
E eu espalhe benefícios
Tempo tempo tempo tempo…
O que usaremos prá isso
Fica guardado em sigilo
Tempo tempo tempo tempo
Apenas contigo e comigo
Tempo tempo tempo tempo...
Quanto a cara do meu filho
Tempo tempo tempo tempo
Vou te fazer um pedido
Tempo tempo tempo tempo..Compositor de destinosTambor de todos os rítmos
Tempo tempo tempo tempo
Entro num acordo contigo
Tempo tempo tempo tempo…
Por seres tão inventivo
E pareceres contínuo
Tempo tempo tempo tempo
És um dos deuses mais lindos
Tempo tempo tempo tempo…
Que sejas ainda mais vivoNo som do meu estribilho
Tempo tempo tempo tempo
Ouve bem o que te digo
Tempo tempo tempo tempo…
Peço-te o prazer legítimo
E o movimento preciso
Tempo tempo tempo tempo
Quando o tempo for propício
Tempo tempo tempo tempo…
De modo que o meu espírito
Ganhe um brilho definido
Tempo tempo tempo tempo
E eu espalhe benefícios
Tempo tempo tempo tempo…
O que usaremos prá isso
Fica guardado em sigilo
Tempo tempo tempo tempo
Apenas contigo e comigo
Tempo tempo tempo tempo...
domingo, 27 de fevereiro de 2011
Assim falou Zaratustra
Inexprimível e sem nome é o que faz o tormento e a delícia da minha alma, e que é, também, a fome das minhas entranhas..."
quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011
Coragem
Coragem para quê? Pergunto-me o que deveria saber para enfrentar a besta fera e, qual seria de fato o meu inimigo, além de mim mesma? Essa pergunta não vai além, fica mesmo por aqui e, resolve se esgotar. Pelo tempo que perco procurando vencer, enfrentar e derrotar a mim mesma, já seria suficiente para me reencontrar com alguma coisa em mim que me faça minha. Eu penso, eu desejo, eu passo boa parte do dia, esgotada, cerrada, encerrada em mim mesma. Não jogo fora os desgostos e não gosto de frivolidades. Admiro o bom humor, mas acho que ele cansa, assim como a melancolia excessiva.
Essa tal coisa em mim que me faça minha, pode mesmo vir de fora, mas prefiro que fique nas formalidades, nos breves encontros e nos poucos amigos e, do olhar, aquele companheiro destro de caminhada.
Um pouco de derrota, uma dose de desilusão e desesperança, um passeio ao abismo das pessoas excluídas. Um brinde aos derrotados: aos fracassados, aos bêbados, aos loucos, aos falidos, as mães solteiras, aos desprezados. Não há amor suficiente no mundo que comporte tanta gente desamparada, é fato. Não há caridade suficiente e legítima(nunca é legítima) que sirva para que algo possa deslocar-se e dotar de sentido o inexplicável esgotamento dos sentimentos bonitos que temos pelos outros seres, simplesmente pelo fato deles existirem. Amamos o belo e o semelhante. Aquilo que nos serve de espelho e nunca aquilo que nos faz ter vontade de quebrar o espelho.
O ser humano é tão precário e pequeno.
Eu não sei amar. Não temo mais a feiura, a inadequação, o fracasso e a miséria. Abraço nesse instante o trágico, meu lado sombra eclipsada, minha porção desfigurada e intensa que me eleva a Deus e aos homens. Abraço a secura, a vertigem, a falta de fé e o vazio de palavras. Lanço-me ao delirante, ao baco, ao contra-peso, ao torto e ao infiel. Cansei de ser bela, frágil, ingênua e doce. Deleito-me nesse calar, nesse cerrar de cortinas; deleito-me ao indespertar, ao acaso fosco, a rouquidão das horas, a inexatidão. Agradeço aos heróis derrotados da minha infância; as noites mal dormidas, ao venenos do corpo e aos poetas ensimesmados.
Pra quê me serve tantos sentidos, tantas palavras, tantas analogias, tantas referências, se agora deixo-me ir por aí afoita, descamisada, sem as palavras... Prefiro dar um tiro no gatuno do que colocar o guizo e servir de tecido para suas garras afiadas...sobra-me cor...age!
Essa tal coisa em mim que me faça minha, pode mesmo vir de fora, mas prefiro que fique nas formalidades, nos breves encontros e nos poucos amigos e, do olhar, aquele companheiro destro de caminhada.
Um pouco de derrota, uma dose de desilusão e desesperança, um passeio ao abismo das pessoas excluídas. Um brinde aos derrotados: aos fracassados, aos bêbados, aos loucos, aos falidos, as mães solteiras, aos desprezados. Não há amor suficiente no mundo que comporte tanta gente desamparada, é fato. Não há caridade suficiente e legítima(nunca é legítima) que sirva para que algo possa deslocar-se e dotar de sentido o inexplicável esgotamento dos sentimentos bonitos que temos pelos outros seres, simplesmente pelo fato deles existirem. Amamos o belo e o semelhante. Aquilo que nos serve de espelho e nunca aquilo que nos faz ter vontade de quebrar o espelho.
O ser humano é tão precário e pequeno.
Eu não sei amar. Não temo mais a feiura, a inadequação, o fracasso e a miséria. Abraço nesse instante o trágico, meu lado sombra eclipsada, minha porção desfigurada e intensa que me eleva a Deus e aos homens. Abraço a secura, a vertigem, a falta de fé e o vazio de palavras. Lanço-me ao delirante, ao baco, ao contra-peso, ao torto e ao infiel. Cansei de ser bela, frágil, ingênua e doce. Deleito-me nesse calar, nesse cerrar de cortinas; deleito-me ao indespertar, ao acaso fosco, a rouquidão das horas, a inexatidão. Agradeço aos heróis derrotados da minha infância; as noites mal dormidas, ao venenos do corpo e aos poetas ensimesmados.
Pra quê me serve tantos sentidos, tantas palavras, tantas analogias, tantas referências, se agora deixo-me ir por aí afoita, descamisada, sem as palavras... Prefiro dar um tiro no gatuno do que colocar o guizo e servir de tecido para suas garras afiadas...sobra-me cor...age!
sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011
subindo
Julia entrou no elevador e deu de cara com onze homens. Todos altos, magros e bonitos. Levou um tremendo susto quando viu aquela tão fantástica e inusitada aglomeração de deuses. Pega de surpresa não sabia como reagir naturalmente à aquele inusitado e másculo encontro; era como em um anúncio da tv, onde a moça embasbacada não sabe bem para onde olhar, o que fazer com as mãos. Teve vontade de sorrir, de se espreguiçar no meio daquilo tudo: Será que eu mereço tanto?Será que papai do céu enviou esse presente especialmente para mim? E se o tal poço for a passagem para uma ilha perdida?Eu queria mais é cair, vamos cair todo mundo!!! ou quem sabe ficar preso durante umas duas horas...E se eu tiver que ser escrava desses homens brutos e viris? Sai pensamento!São somente doze andares, onze homens!! é preciso agir, agir...
O mais belo próximo à porta a encara sem timidez sussurrando:
"porque não coloca logo o batom e aproveita pra fazer aquilo que você nunca mais na vida terá a oportunidade de fazer? ”Fazendo um beicinho com os lábios carnudos.
"porque não coloca logo o batom e aproveita pra fazer aquilo que você nunca mais na vida terá a oportunidade de fazer? ”Fazendo um beicinho com os lábios carnudos.
Batom, fazer, vida, onze homens...Pensou tanto que nada fez, se arrependimento matasse, cairia estirada naquele corredor estreito.
Correu assustada para dentro do apartamento de seus avós. Um apartamento quarto e sala pequeno onde todos cabiam bem, agora estava pequeno demais. Assustada, correu para a cozinha e notou que as janelas que davam para o corredor estavam abertas e, pensou, quem sabe eles pulam aqui dentro. O gênio da lâmpada ouviu seus pensamentos, aqueles homenzarrões entraram pelas janelas, um seguido do outro, como se fossem espiões, ninjas treinados. Julia não sabia se corria para a sala, se oferecia um copo dágua, ou se arrancava logo o vestido se jogando em cima deles, como num moche em um show de rock.
Ela percebeu que era apenas uma coadjuvante e, resolveu render-se a tão adorável conspiração.
Foram para a sala, ela e aquele que deu a investida no elevador. Os outros? Acho que foram para o quarto, parecia haver mais gente por lá. Julia olhou para ele com aquele olhar ingênuo pecaminoso; como se perguntasse sem palavras qual seria o próximo passo, como se não soubesse. Apressou-se em não perder mais a deixa e dessa vez foi direta, botão por botão, firme do desabotoar do vestido. "Eu só faço uma coisa". Foi virando ela de lado, acariciando seus cabelos, respiração quente na nuca. "Como assim: só faço uma coisa?" É, só faço mesmo o número dois.“ Virando-a bruscamente de costas, empurrando-a de quatro para o chão.
Até aquele momento estava certa; ia despir-se de seus valores morais, entregaria-se à aquele adorável desconhecido que lhe sugerira beijos de batom no elevador, agora queria fazer logo de cara, o número dois.
Número dois ...não era como se chamava o ato de evacuar no banheiro, que coisa mais grosseira, um estranho tão belo, de porte elegante, conseguiria tudo de mim, agora resolveu falar, falar em número dois.Foi se erguendo lentamente, tirando as mãos que já estavam espalmadas do chão. Não podia calar-se, tomar-me nos braços, ir aos poucos acariciando minhas costas, descendo a mão suavemente pela lombar, encostando-se em meu corpo: imenso, rígido...quando eu percebesse já teria me deixado levar... agora, resolveu abrir essa boca imunda...
Abotoei o vestido, ajudei-o a levantar as calças como se faz com uma criança desajeitada, ele sorriu sem graça e dali tomou seu rumo incerto, sem ao menos tentar contornar a desastrosa intervenção numérica.
segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011
domingo, 6 de fevereiro de 2011
Hilda Hilst
Nave
Ave
Moinho
E tudo mais serei
Para que seja leve
Meu passo
Em vosso caminho,
Dizeis que tenho vaidades.
E que no vosso entender
Mulheres de pouca idade
Que não se queiram perder
É preciso que não tenham
Tantas e tais veleidades.
Senhor, se a mim me acrescento
Flores e renda, cetins,
Se solto o cabelo ao vento
É bem por vós, não por mim.
Tenho dois olhos contentes
E a boca fresca e rosada.
E a vaidade só consente
Vaidades, se desejada.
E além de vós
Não desejo nada.
sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011
Quem não me conhece que me compre
sou nada barata e quase sempre cara
Minha cara
distraída
Esqueço de mim
apago um pouco os passos
corro, vôo
carros passam
carros demais
rápido demais
pessoas gritam, zombam de mim
pessoas zombam de mim
os loucos são aqueles
resolvem
simplesmente resolvem
vão
Sou alma perdida
asa quebrada, leite derramado, pedaço de mim
criança
sento montada em um adulto
Penso não, penso não
Penso não, penso não
sou nada barata e quase sempre cara
Minha cara
distraída
Esqueço de mim
apago um pouco os passos
corro, vôo
carros passam
carros demais
rápido demais
pessoas gritam, zombam de mim
pessoas zombam de mim
os loucos são aqueles
resolvem
simplesmente resolvem
vão
Sou alma perdida
asa quebrada, leite derramado, pedaço de mim
criança
sento montada em um adulto
Penso não, penso não
Penso não, penso não
terça-feira, 1 de fevereiro de 2011
de olhos abertos
Fui dar uma voltinha no céu. Lá me pareceu um lugar como outro qualquer, onde circulavam muitas pessoas: estranhas, desconhecidas, umas mais aflitas que outras, algumas um pouco menos desorientadas; outras completamente perdidas, despersonalizadas; carcaças desalmadas, desencarnadas, pedaços humanos despessoalizados.
Não eram almas desencarnadas. Ainda estavam por aqui e por lá, ao mesmo tempo e agora.
Consciente e desperta, de olhos semi-abertos; sinto que vou adormecendo de novo e, penso que ,talvez, não seja bem o céu aquele lugar por onde andei, não aquele céu que eu imaginava: hedonísta, encantado.O meu céu.
Tudo começou mais ou menos assim. Um barco virava de um lado para o outro, em um movimento pendular frenético; um casal estava preso à borda, agarravam- a com força; como num barco viking do parque de diversões, só que sem os cintos de segurança, era ao mesmo tempo divertido e perigoso, num movimento de vai e vem, de vida e de morte. De fora, observava aflita e imaginava que caso soltassem as mãos, talvez pudessem sobreviver, porém estavam presos àquele movimento repetitivo e ele os levaria ao gran finale.
Pessoas olhavam, como numa grande arena, quando uma mulher com longos cabelos negros se jogou, agarrando também a embarcação e prosseguindo ao lado do casal, agarrando a borda do brinquedo. Não via água, apenas, suponho que fosse, pois um barco flutua na água. Porém, essa imagem não é real, tridimensional e, nesse desembaraçar de palavras, não me atenho aos aforismas; jogo fora os preceitos morais na não-tão-justa-medida. O barco afundava em alguma substância e retornava veloz à tona, cada vez mais rápido, como um barco de brinquedo dentro de uma banheira, nas mãos de uma criança onipotente, gigante e feroz.
A mulher de longos cabelos negros foi junto para o fundo, ou para o raso, pois não posso precisar se era embaixo ou em cima, se estava raso ou se era profundo. Não sobrou ninguém pra contar a história. Quer dizer, eu estou aqui para contar a história.
Nesse mundo de pessoas tortas e aflitas que se esbarram diariamente, despertei de olhos fechados e, sabia ser aquele canto do tempo, um céu, um novo e desconhecido céu.
Dei um salto, fiz uma passagem, atravessei o portal e lá estava eu andando em um lugar que dei o nome, no princípio da coisa, de céu. Eu procurava um abrigo, uma saída, um reconhecimento.
O céu dos desesperados, dos desterrados, dos desalmados; substância humana em estado de inconstância, sem pouso, nem repouso.
Não havia casas, nem lugares privados, eram terrenos compartilhados, grupos que se reuniam, como se obedecessem alguma ordem invisível; eu circulava entre eles, como se procurasse um canto para mim, naquele emaranhado de almas despregadas. Eu era mais uma, desgarrada de minha couraça de crenças e pensamentos, parte do rebanho, buscando consolo, orientação: - alguém poderia me dizer aonde ficar!!
Recordo vagamente de uns rostos com certa familiaridade. Pipocava de um lugar para o outro, não tinha tempo para conversar, para descansar, tempo, não tinha tempo. Havia atravessado a terceira dimensão, estava na quarta dimensão espacial; mais precisamente, numa quinta e misteriosa dimensão, em um recanto quadridimensional.
Agora posso lembrar melhor dos detalhes e também afirmar que qualquer julgamento racional de minha parte me faria esquecer de novo essa viagem ortogonal. Fagulhas humanas eram semelhantes e ao mesmo tempo diferentes à minha imagem, era como se meu reflexo estivesse desfocado, como numa revelação imprecisa de um outro rosto que já nem era meu e de mais ninguém.
...
terça-feira, 11 de janeiro de 2011
tinta fresca
começo
recomeço
bruma desconhecida
estado d alma
enebriante
vela meio acesa
vela meio apagada
dialogo entre o corpo e a alma
de costas para a mente repetitiva
mente repetitiva falando sozinha
eles dançam um bailado só deles
tonteio
enjôo
afino
véu no olhar
presença
ausência
dessignificar
...
recomeço
bruma desconhecida
estado d alma
enebriante
vela meio acesa
vela meio apagada
dialogo entre o corpo e a alma
de costas para a mente repetitiva
mente repetitiva falando sozinha
eles dançam um bailado só deles
tonteio
enjôo
afino
véu no olhar
presença
ausência
dessignificar
...
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